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Parceria Moinhos 2023

Seleção de Parceria Moinhos 2023

Conheça os perfis selecionados para a parceria com a editora durante este ano.

Em abril, a Moinhos voltou a abrir seleção para parceria de produtores de conteúdo literário na internet e hoje é o dia de conhecer quais são os perfis que farão parte de nosso time durante todo o ano de 2023.

Foi uma surpresa imensa quando vimos tantos trabalhos inscritos, todos muito lindos, e notamos que tínhamos um desafio pela frente: selecionar apenas alguns devido ao número limitado de vagas.

Depois de muito analisar, de ler cada resposta àquela “pergunta chata” com carinho e ver o quão dedicada cada pessoa é com seu trabalho e amor à literatura em toda sua diversidade, chegamos aos perfis selecionados que farão parte do time de parceria da Moinhos neste ano.

Conheça os perfis (e as pessoas por trás deles) na lista abaixo. Mas antes, queremos agradecer a cada inscrito pelo interesse em levar a Moinhos a mais cantos e parabenizar por cada projeto apresentado. Realmente foi um trabalho difícil selecionar apenas alguns.

Aêgla Benevides – Instagram: https://www.instagram.com/inlibriveritas |

Alex Zani – Blog: https://faziapoesia.com.br | Instagram: https://www.instagram.com/faziapoesia | Twitter: https://twitter.com/faziapoesia

Alexandre de Almeida – Instagram: instagram.com/estantedoale | Twitter: twitter.com/estantedoale

Ana Claudia Lôbo Leão Munhoz – Facebook: www.Facebook.com.br/foconaleiturabsb | Twitch: www.Twitch.tv/CauMunhoz | Instagram: www.Instagram.com/caumunhoz | Twitter: www.Twitter.com/caumunhoz

André Pimenta Mota – TikTok: http://tiktok.com/@arboreoliterario | Instagram: https://www.instagram.com/arboreoliterario

Beatriz Quaresma de Souza – Instagram: https://instagram.com/latinohablante

Bianca Santos Oliveira – Instagram: https://instagram.com/lendonegres

Bruno Damien da Costa Paes Jürgensen – Podcast: https://open.spotify.com/show/3ivsAR0hdub2EQF5SRitEj?si=7221530f698445cd | Instagram: https://www.instagram.com/damienjurgensen

Catharina Regina Mattavelli Costa Rivellino – Instagram: https://www.instagram.com/catharinamattavelli

Danielly Cardoso Pacheco – Instagram: https://instagram.com/mulherdoslivros

Dayane Suelen de Lima Neves – Instagram: https://www.instagram.com/daylneves

Elaine Trevizan de Souza – Blog: https://projetodeescritora.art.blog | Twitch: https://twitch.tv/naneverso | YouTube: https://youtube.com/c/naneverso | Instagram: https://instagram.com/et.revizan

Emili Fano Fernandes – YouTube: https://youtube.com/@emilifano-genteliteraria4709 | Instagram: https://instagram.com/genteliteraria

Fernanda Camilo Prates – Blog: http://modoliterario.blogspot.com | Instagram: http://www.instagram.com/blog.modoliterario

Gabriela Gomes – YouTube: Youtube.com/entreprologoseepilogos | Instagram: Instagram.com/ggabsggomes | Twitter: Twitter.com/ggabsggomes

Gabriela Pimenta – Instagram: https://www.instagram.com/aspasliteraria/ | Twitter: https://twitter.com/AspasLiteraria

Gean César dos Santos Nogueira – Instagram: https://www.instagram.com/epitomeliteraria

Gisele Karine Oliveira Angelo – YouTube: https://youtube.com/@enquantoissoleio | Instagram: https://instagram.com/enquantoissoleio

Gleyce Gabrielly Marques – YouTube: https://www.youtube.com/@RetratodaLeitora | Instagram: https://www.instagram.com/retratodaleitora

Humberto Conzo Junior – Facebook: https://www.facebook.com/groups/clubedeliteraturabrasileiracontemporanea | Blog: www.primeiraprateleira.com | YouTube: www.youtube.com/c/humbertoconzojunior | Instagram: https://www.instagram.com/primeira_prateleira

Indira Souza Santos Lima – Instagram: https://www.instagram.com/indirareads

Isa Maria Marques de Oliveira – Facebook: www.facebook.com/corujadasletras | Blog: https://www.casavamosler.blog/profile/corujadasletras/profile | Instagram: https://www.instagram.com/corujadasletras

Isaias Gonçalves Ferreira Lima – Instagram: https://instagram.com/livrobakana

Jaqueline Schmitt da Silva – Blog: https://jaquelineschmitt.medium.com | YouTube: https://www.youtube.com/@jaquelineschmitt | Instagram: https://instagram.com/jaquelivros | Twitter: https://twitter.com/jaqueschmitt_

Jéssica Vaz de Mattos – YouTube: https://www.youtube.com/jessicamattos | Instagram: https://www.instagram.com/jessicavmattos

Juliana Costa Cunha – Instagram: https://www.instagram.com/coisasqueleio |

Letícia Ferreira Rodrigues – Instagram: https://www.instagram.com/entrelinhaspretas

Lili Pereira da Silva – Instagram: https://www.instagram.com/thedarksideofrainbow

Lucas Carvalho de Freitas – Blog: https://diariodeleituradolucas.blogspot.com/?m=1 | YouTube: https://youtube.com/@diariodeleituras | Instagram: https://instagram.com/lucascafre

Luis Claudio Ferreira Silva (Luigi Ricciardi) – YouTube: https://youtube.com/@acropolerevisitada5447 | Instagram: https://instagram.com/acropolerevisitada

Lurdes Kras – Instagram: www.instagram.com/bibliotecainquieta

Marcelle de Saboya Ravanelli – Instagram: https://www.instagram.com/leiturasdimacondo

Maria Neide Leite de Aquino Tavares – Instagram: https://instagram.com/umlivro_umaviagem

Mariana Ferreira Antero Lichy – Instagram: https://www.instagram.com/livros_do_saturno

Marilú Medrado Barreto – Instagram: https://www.instagram.com/_compartilhandosaberes

Matheus Lima – Instagram: https://www.instagram.com/desleitor

Michael Oliveira e Raphael Sales – Instagram: https://www.instagram.com/alegrias.violentas

Monick Miranda Tavares – Instagram: www.instagram.com/literoamericanos

Nádya Helena Macário – Facebook: https://www.facebook.com/livroincena | Instagram: https://www.instagram.com/livroincena

Niége Casarini Rafael – Instagram: https://www.instagram.com/niegecr | Twitter: https://twitter.com/niegecr

Noemia Francisca de Souza – Instagram: https://instagram.com/estante_da_no

Paulo Fonsêcà Marinho Júnior – Instagram: https://www.instagram.com/literaturaemcores

Paulo Lannes – Instagram: https://www.instagram.com/lendoarte

Pilar Lago e Lousa – Blog: https://vertebralatina.blogspot.com | Instagram: https://www.instagram.com/vertebralatina

Rafael Lutty Vilhena da Silva – Instagram: https://www.instagram.com/pseudomatico

Rafael Mussolini Silvestre – Blog: https://rafamussolini.blogspot.com | Instagram: https://www.instagram.com/rafaelmussolini

Rafaela Germano Martins – Facebook: https://www.facebook.com/MulheresNoHorror | Blog: https://www.mulheresnohorror.com | Instagram: https://www.instagram.com/mulheres.no.horror

Rafhael Peixoto Teixeira – Instagram: https://www.instagram.com/literaturanograu

Raissa Tainá Carvalho de SantanaYouTube: https://youtube.com/@leiturasdeboteco | https://instagram.com/leiturasdeboteco

Rodrigo Villela Pereira – YouTube: https://www.youtube.com/@RodrigoVillelaLeiaparaViver | Instagram: https://www.instagram.com/leiaparaviver

Rosângela Nascimento Gomes Machado – Instagram: https://www.instagram.com/rodeletras

Simone Soares – Facebook: https://www.facebook.com/feravellareventos | Blog: https://feravellar.blogspot.com | Instagram: https://www.instagram.com/simone_soares_eventos

Stephanie Sandim Reis – TikTok: http://tiktok.com/@papeandosteh | Instagram: https://instagram.com/papeandosteh

Tarcila Tanhã – YouTube: https://youtube.com/@vratata | Instagram: https://www.instagram.com/vra_tata

Tathiane Rodrigues de Souza – Facebook: Facebook.com/doidosporserieselivros1 | Blog: Doidosporserieselivros.blogspot.com.br | Instagram: Instagram.com/doidosporserieselivros

Tatiana de Aquino Mascarenhas – Instagram: https://www.instagram.com/nacontracapa

Thaise Gonçalves Dias – YouTube: https://youtube.com/@literaturasemfrescura | Instagram: https://www.intagram.com/realidadeliteral

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Para aplaudir de pé neste fim de ano

Livros arrebatadores para você encerrar 2022 com chave de ouro.

Tem gente que gosta de contabilizar as leituras feitas durante todo o ano. Tem quem goste de fazer algo mais elaborado, com infográficos para saber quantos livros leu de determinado país, gênero literário ou de quem escreveu o livro. Ainda existem aqueles e aquelas que contam a quantidade de páginas lidas. No final das contas, o que vale é se as leituras foram boas, bem aproveitadas, fizeram alguma diferença na nossa vida, seja pelo soco no estômago, seja pelo quentinho no coração.

Eis que vem o fim do ano queremos ler AQUELE livro, que feche tudo com chave do ouro, que ao virar a última página nos faça aplaudir a obra de pé, com um ar de “caramba, que livro é esse?!”. Tão boa essa sensação, não?

Livros existem aos montes e talvez o arrebatamento venha de um livro que você menos espera. Mas como saber que livro é esse? Há algumas alternativas: você pode escolher às cegas para ver se a obra te surpreende; você pode se atrair pela capa; você ainda pode levar em conta indicações de pessoas em quem você confia quanto a gosto literária. É aí que a gente entra!

Você confia na Moinhos? Se a resposta é sim, vamos deixar aqui algumas dicas de livros que podem te surpreender, extasiar e fazer com que aplauda de pé depois de ter lido a última frase. Isso não falamos apenas por nós! São livro que, quem leu, não mede palavras para exaltar (sem exagero nenhum). E tem para todos os gostos e estilos, confere aqui a lista:


Todo esse amor que inventamos para nós, de Raimundo Neto

Neste volume de contos as vozes são muitas e uma só. Construído numa linguagem poética, é na vida prosaica que os personagens circulam como diante de nossos olhos. Encarnados, pulsantes, naturezas que não cabem nos nomes que recebem. No universo onde a homossexualidade é castrada e violentada, as narrativas encaminham nossa leitura para o interior de necessidades e desejos que raramente são tão bem iluminados. Conduzem o leitor ao interior dos personagens para ouvir “aquele som de caverna esvaziada, inexplorada, e fogueira apagada há milênios”. Os personagens procuram costurar a própria identidade. Costuram o que foi rasgado, rompido, interrompido. Querem ser chamados pelo nome. Mas o nome não nomeia. O trauma prende seus protagonistas ao presente, “o tempo é questão de ferida”, tornando-se insuportável. Neste potente livro o que é limite torna-se limiar, a ferida está sempre prestes a aumentar. A obra investiga a casa como um corpo, o corpo da mãe e o corpo do mundo, o quanto esse corpo é vivo e abrigo, e o quanto ele é a câmara que precede o desfazimento. “Como é que escapa de uma mulher todo esse amor que inventamos para nós na casa?”.

Andréa Del Fuego


Kramp, de María José Ferrada
(tradução de Silvia Massimini Felix)

Unidos por um catálogo de produtos de serralheria da marca Kramp e viagens num Renault velho por estradas, povoados e cidades, uma filha cresce ao lado de seu pai, caixeiro-viajante, a aprender ensinamentos sobre o mundo e vida. Da infância à adolescência, M narra seus aprendizados e o correr dos anos, até o evento que marca uma ruptura na família, acionando o dispositivo dos sintomas parentais e outras rupturas e mais questionamentos sobre o universo e as peças que não se encaixam, as dores desparafusadas que se acumulam, e o revelar das engrenagens discretas do afeto rangendo no crescer da sua maturidade.

Livro vencedor do Prêmio de Melhor Romance do Círculo de Críticos de Arte, do Prêmio de Melhores Obras do Ministério da Cultura (categoria romance) e do Prêmio Municipal de Literatura em Santiago.


As aventuras da China Iron, de Gabriela Cabezón Cámara
(tradução de Silvia Massimini Felix)

“Foi o brilho”, assim começa As aventuras da China Iron. A história conta o renascer de Iron, mulher mestiça que escapa do marido acompanhada da cadela Estreya. Elas encontram Liz, uma inglesa com quem cruzarão a pampa argentina rumo ao delta do rio Paraná. Tudo nesta narrativa é intensificado sob a luz pampeana: cores, saberes-sabores, o amor lésbio, a linguagem prismática e a comunicação interespécies.

A paródia do Martín Fierro, livro fundador da literatura argentina, alcança aqui seu princípio modernizador: uma relação dialética faz do modelo um antimodelo ao criar sentidos textuais novos e muito além da imitação.

Em 2020 esteve entre os finalistas do International Booker Prize.

Davis Diniz


Todo naufrágio é também um lugar de chegada, de Marco Severo

Não existe transformação possível se a travessia for serena. É o que parece nos dizer esta obra de Marco Severo que você pode estar prestes a ler. Em cada conto, em cada personagem, situações colocam o ser humano confrontado com o mundo à sua volta e consigo mesmo. Reunidas nestas vinte histórias estão o medo, a loucura, a infância amarga, a velhice decrépita, a desesperança, a morte. Mas não só, porque falar dessas coisas é também tratar do seu oposto.

É assim que o leitor entrará em contato com a paz advinda do aprendizado amoroso, as descobertas dos muitos eus que nos habitam, o recomeço após perdas debilitantes, a esperança que não se perde nunca. São histórias de homens e mulheres soltos no inescapável labirinto da vida, por onde ninguém passa incólume. Para além do devir inerente ao ser humano em sua imensa capacidade de mutação, esta obra perfaz no leitor o trajeto de volta, o olhar generoso para com as vivências possíveis, a delicadeza que existe em cada gesto.


Sara Luna, de Tom Maver
(tradução de Fernando Miranda)

Sara Luna, de Tom Maver, é muito mais do que um livro de poesia. É uma história. É uma pessoa, uma mulher, uma senhora de idade, uma avó. É também um caminho que o sujeito lírico busca encontrar porque precisa saber de suas raízes, por quais veredas sua ancestralidade andou e de onde vieram aqueles que lhes puseram no mundo. Em tudo, há um ponto de partida, sabemos que nem sempre de chegada, mas aqui, em Sara Luna, ou em Sara Luna, há um fim, ou um fim possível. A voz que nos conta as histórias, por meio dos poemas que Tom Maver escreveu, nos faz ficar de cócoras, ao lado do fogo sob o céu estrelado, ouvindo histórias de alguém antigo, que fala uma língua que já não se escuta, já não se conhece.


O poeta de Pondichéry, de Adília Lopes

Diderot (ou quem fala por ele em Jacques le Fataliste) recebe um jovem que escreve versos. Acha os versos maus e diz ao jovem que ele há-de fazer sempre maus versos. Diderot preocupa-se com a fortuna do mau poeta. Pergunta-lhe se tem pais e o que fazem. Os pais são joalheiros. Aconselha-o a partir para Pondichéry e a enriquecer lá. E a que sobretudo não publique os versos. Doze anos mais tarde o poeta volta a encontrar-se com Diderot. Enriqueceu em Pondichéry (juntou 100 000 francos) e continua a escrever maus versos.

Porque é que o mau poeta deve ir para Pondichéry e não para outro lugar? Porque é que os seus pais são joalheiros? Porque é que juntou 100 000 francos?   E porque é que passou doze anos em Pondichéry? Não sei explicar. O que me atrai é precisamente isto: Pondichéry, pais joalheiros, 100 000 francos, doze anos.


Estes são apenas alguns dos livros do nosso catálogo que têm o poder de impactar de diversas formas e, quem sabe, vão fazer você finalizar o ano com um novo favorito da vida. Ah, todos eles estão disponíveis em e-book, você pode adquirir na nossa livraria online e começar a ler na hora. O que acha?

Clique aqui para acessar a livraria online da Moinhos.

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O horizonte inalcançável em obra de Margarita García Robayo

Emigração latina, negação das raízes e o contraste entre sonho e realidade em “Até que passe um furacão”, primeiro romance da escritora colombiana publicado no Brasil

“Sonhar não custa nada”, já diria o ditado popular que se tornou parte de um samba-enredo. A questão é saber o quanto custa para realizar um sonho – financeira, física e psicologicamente –, se esse for o real objetivo. Qual é o preço a se pagar para chegar onde deseja? O quanto de si é preciso doar para alcançar o objetivo traçado? Vale a pena passar por cima de tudo e de todos para conquistar o que tanto sonha?

Perguntas desse tipo quase sempre passam pela cabeça de quem quer algo novo na vida. Pesar os prós e os contras é um dos primeiros passos para quem planeja uma mudança. Porém, nem sempre é a regra, ainda mais ao se tratar de uma mudança radical de vida por insatisfação ou desgosto com a atual situação em que se encontra. Buscar os meios disponíveis e criar os indisponíveis para conseguir chegar no destino traçado requer esforço, força de vontade e persistência. Há quem consiga, com certo mérito, e se torne um exemplo a seguir. Há quem não tenha tanta paciência para enfrentar as pedras no caminho e escolha um desvio supostamente mais fácil, mas que traz consequências percebidas no corpo e na alma e questionadas com o tempo.

Dilemas que fazem parte da vida de toda gente, mas que são constantes para quem vive nas periferias ou naquele lugar que não é nem uma coisa nem outra, um meio indefinido que suplica por definição, dispostas a negar suas origens para chegar onde almeja. Ouvimos (e vemos) muito sobre essa realidade na América Latina, e é o que encontramos em Até que passe um furacão, primeiro romance de Margarita García Robayo, escritora colombiana radicada na Argentina, primeiro a ser publicado no Brasil pela Editora Moinhos.

Narrativas breves, impacto permanente

Nada contra textos longos, ricos em detalhes que nos fazem imaginar cenários existentes e inventados à perfeição como se já tivéssemos estado no lugar. Obras assim são fascinantes, mas é de se aplaudir quando alguém consegue o mesmo feito escrevendo de forma sucinta. Textos curtos nem sempre são sinônimos de textos simplórios, sem corpo, sem “sustância”. E na arte de escrever pouco e impactar muito Margarita García Robayo tira de letra.

Nascida em Cartagena em 1980, a escritora partiu de sua terra natal pouco depois de completar 18 anos e, desde 2004, mora em Buenos Aires. Tanto na Colômbia quanto na Argentina, Robayo escreveu para mídias físicas e digitais, como o blog Sudaquia: historias de América Latina, do jornal argentino Clarín; a coluna La cuidad de la fúria, no diário Critica de la Argentina; um periódico na revista colombiana Soho; e o folhetim Mi vida y yo, na Revista C, usando o pseudônimo Carolina Balducci. A escritora também já foi professora na Fundación Nuevo Periodismo Iberoamericano (instituição criada por Gabriel García Márquez) e diretora da Fundación Tomás Eloy Martínez.

Habituada a textos curtos, Margarita transmite uma essência encorpada aos relatos feitos em crônicas, contos, ensaios e novelas, qualidade reconhecida e premiada internacionalmente. Publicou os livros de contos Hay ciertas cosas que una no puede hacer descalza (2009), Las personas normales son muy raras (2011), Orquídeas (2012) e Cosas peores (2014), este último agraciado com o prêmio Casa de las Américas. Entre as novelas, estão Hasta que pase un huracán (2012), Lo que no aprendí (2013), Tiempo muerto (2017) e Educación Sexual, que foi publicada de forma fracionada entre os números 114 e 119 da revista Piauí (2020). No Brasil, participou da Festa Literária Internacional de Cachoeira (Bahia, 2018) e teve o ensaio El Mar publicado na 7ª edição da revista Puñado (editora Incompleta, 2021). No cenário além América, a Charco Press lançou no Reino Unido a coleção Fish soup e o romance Holiday heart, ambos premiados com o PEN Awards.

Agora, pela primeira vez publicado na íntegra, o romance Até que passe um furacão chega em terras brasileiras pela Editora Moinhos, com tradução de Sílvia Massimini Felix, obra em que Robayo prova que “menos é mais” e coloca intensidade na medida certa para acertar pontos vitais da realidade latino-americana, como uma acupunturista que não sana as dores, mas as releva ao falar da busca por um sonho que, por vezes, não passa de uma quimera.

Sonho realizável ou utopia coletiva?

A história da América Latina se confunde entre os países. Todos compartilham de dois lados: o cartão postal onde os turistas ostentam fotos e esbanjam dólares, locais bem estruturados e bem financiados, onde os sorrisos se manifestam; e o lado da realidade da grande maioria que vive à beira dos cartões postais, em meio a descaso social, infraestrutura negligenciada e ostentando um imenso desejo de fugir. A fuga se torna o único meio para que as coisas melhorem e é esse desejo de fuga que sente a protagonista de Até que passe um furacão, primeiro romance de Margarita García Robayo.

A jovem não nomeada narra sua vida como residente da costa do Caribe colombiano, destino turístico para tantos, lugar indesejado por ela. Sua vontade é ser estrangeira, partir do país de origem, renegar seu passado e viver o sonho americano, um clichê latino-americano tão visado a ponto de as pessoas se sujeitarem ao que for necessário, desde travessias perigosas até a entrada ilegal na América do Norte e um compromisso romântico ao estilo 90 Dias para Casar (reality show do canal TLC/Discovey) para garantir o green card.

A protagonista de Robayo está disposta a usar todos os artifícios de que possui para conquistar seu sonho e nos conta a sua vivência em um bairro que alaga em dias de chuva intensa e deixa o barro que é carregado pelas botas para dentro de casa. Ela não quer o comodismo dos pais que não fazem questão sair de onde estão; ela quer se mover, correr atrás de seus objetivos e ter tudo o que acredita merecer. E aprendeu desde muito nova como conseguir, por abusos sofridos e mal percebidos por não ter quem os denunciasse a ela.

Dentre várias tentativas, ser comissária de bordo foi um meio que conseguiu de sair do solo e voar ao país tão cobiçado, conhecer pessoas influentes (ainda que de forma duvidosa), apaixonar-se, querer mais e, enfim, dar-se conta de que, onde quer que esteja, a realidade se difere daquilo que está na nossa cabeça. Não existe um mundo encantado e repleto de oportunidades promissoras. Há dores, há tédio e há a eterna sensação de que “o movimento é uma ilusão”. O sentimento de não pertencimento nem sempre desaparece com a conquista do objetivo, ele fica estagnado tanto quanto se não tivesse saído do lugar, como se esperasse o furacão passar. E ele nunca passa.

Com objetividade, crueza um toque niilista, Margarita García Robayo nos entrega uma obra que conversa com a realidade do lado de baixo do nosso continente, abordando temas sociais, políticos e pessoais inerentes à América Latina, assim como reflexões intimistas que revelam o abandono, a violência e desdém destinado à nossa gente, em especial aos que vivem de forma mais vulnerável, na pobreza ou que dela beiram.

Cirúrgica em todos os pontos, a escritora colombiana coloca em poucas páginas uma imensidão de acontecimentos com a promessa de impacto. E o impacto realmente vem!

Um dos últimos lançamentos da Moinhos de 2022, Até que passe um furacão é a garantia de uma leitura rápida, porém impressionante, carregada da força da escrita elogiada de Margarita García Robayo, uma das mais proeminentes vozes da literatura latino-americana.

Conheça Até que passe um furacão clicando aqui!

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Luto, cansaços e dores: o ordinário que impacta na literatura Mahana Cassiavillani

por Aline Teixeira


Em terceiro livro de contos, autora escancara situações e sensações controversas nas entrelinhas do cotidiano.


Os dias de uma pessoa são cercados por acontecimentos, dos mais banais aos mais complexos. Afinal, a vida acontece e a pessoa é convidada indispensável desse grande evento, quer ela queira, quer não.  As relações interpessoais e intrapessoais ditam o desenrolar da festa e o caminho a um desfecho quase sempre inesperado, que pode tanto ser breve quanto durar uma existência toda.

De tão constantes, os tais acontecimentos, ainda que de dimensões incalculáveis, acabam por se tornar triviais e deixam de reivindicar a atenção muitas vezes necessária a nível pessoal e social. Cada qual vive sua vida conforme acredita ser correto, cada um faz o que acha que deve ser feito, todo mundo tem direito de expressar ou esconder sua opinião e ai de quem contestar. E ninguém mais contesta, às vezes sequer sente. Tudo está normalizado, nada mais choca. Até que um livro, que narra situações corriqueiras, coloca o dedo na ferida, cutuca e mostra que as coisas não são tão normais assim.

Através de uma coletânea de contos simples, porém incisivos, a escritora paulista Mahana Cassiavillani apresenta seu terceiro livro e mostra sua potência narrativa ao falar sobre acontecimentos vistos no dia a dia de forma a atingir o leitor em cheio, causando tanto identificação quanto repulsa.

A literatura como estilo de vida e salvadora de vidas

Há quem diga que a literatura não serve para nada, há quem diga que ela é capaz de salvar vidas. Mahana Cassiavillani é do time das pessoas que acreditam que só a literatura salva, tanto que está presente em sua vida desde que se conhece por gente e a acompanha nos momentos bons e nos momentos de dificuldade.

Nascida na cidade de Santo André (SP) em 1983, desde pequena viu o fascínio literário brotar ao folhear páginas de livros infantis logo na primeira infância, encanto que continuou na adolescência e seguiu até encontrar um gosto e estilo próprios, incorporados à sua personalidade e refletidos em seu trabalho.

A paixão pela arte da escrita levou Mahana às Letras, formando-se pela Universidade de São Paulo (USP), seguindo para a pós-graduação em Estudos Brasileiros pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e o mestrado em Literatura pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

Logo na estreia como contista, ganhou uma seção só para ela na revista Ponto da editora SESI, a Ponto do Novo Conto. Depois, se juntou ao grupo Work in Progress, dirigido pelo vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura e finalista do Jabuti Marcelo Maluf, autor de A imensidão íntima dos carneiros.

Elogiada por seus colegas pela facilidade em cativar e causar estranhamento com seus escritos, Mahana publicou seu primeiro livro, Deus é bom e o diabo também (editora Dobradura), lançado em 2017, onde já mostra o que vem a ser sua marca registrada, o domínio pleno na escrita de contos que permeiam o lirismo e a pungência de forma concisa. Característica esta também impressa no segundo trabalho, o livro O caminho da serpente (editora Fábrica de Cânones), de 2020.

Agora, com seu terceiro livro de contos, o estilo Mahana Cassiavillani de literatura se confirma e firma seu nome como um dos mais potentes no gênero, dispondo-se a contar coisas que todos sabem, todos sentem, mas nem todos admitem ou querem enxergar.

Dores que cansam, cansaços que doem

Uma infinidade de sentimentos faz parte da essência humana e nos acompanha constantemente. Alguns deles nem sabemos nomear, outros resumimos como uma coisa só. No caso do título do novo livro de Mahana Cassiavillani, vários deles foram englobados em três que, por sinal, descrevem com perfeição muito daquilo que não encontramos denominação adequada: Luto, cansaços e dores.

A tríade que nomeia a obra também encabeça as três partes em que o livro é dividido. Em Luto, ficam os relatos mais breves, mas com tamanha profundidade que as palavras não se fazem necessárias. Já em Cansaços, a proximidade com o cotidiano é gritante e quase impossível se esquivar de uma identificação, seja na própria vida, seja na vida de algum conhecido. Dores abarca o último estágio de um sentir que não vê mais rotas de fuga e muitas vezes se resigna.

Se por um lado temos aquilo que está entranhado na pessoa e que nem sempre está à mostra (por vontade ou por falta de oportunidade), por outro lado estão as relações humanas e suas complexidades. Com esses elementos-chave, Mahana brinca de nos contar histórias de indivíduos que poderiam ser qualquer pessoa e esse “ser qualquer pessoa” é o que mexe com o leitor – mexe com o ego, mexe com os princípios, mexe com ideologias, mexe com os pré-conceitos. Esse mexer incomoda, confronta e faz com que ora se compartilhe as emoções, ora as repudie, julgando-as incabíveis.

Ao se tratar de pessoas e da convivência mútua, as expectativas são pontos cruciais que, em grande parte, ditam as regras da vivência de alguém. Expectativas são criadas em diversos níveis e a autora aborda uma porção deles através do relacionamento de pais e filhos, relações profissionais, conjugais e até consigo próprio.

A beleza de Mahana está em colocar o peso devido às situações sem o colocar de fato. Com escrita suave atribuída aos pensamentos e devaneios, a autora evidencia calos e feridas de forma chocante, sem perder o tom sarcástico e irônico, o que torna a leitura absurdamente divertida. Absurdo porque muitas das situações não são engraçadas, são angustiantes. Outro ponto forte é a imparcialidade, seus narradores são diversos e suas narrativas não os julgam, independentemente do lado em que eles estejam; eles simplesmente são.

O emaranhado de sentimentos apresentado demonstra as dores inerentes e causadas, essas dores cansam e o sentimento é passado a quem acompanha os contos curtos, porém intensos. Esse cansaço faz doer e dói no físico, o leitor também sente isso. No luto, há uma combinação de ambos e isso torna a obra de Mahana completa. Com pouco mais de 100 páginas, Luto, cansaços e dores é um dos mais novos lançamentos da Editora Moinhos e marca a chegada de Mahana Cassiavillani à casa, somando ao time de autores com sua potência e singularidade que a colocam no patamar de grandes nomes da literatura brasileira contemporânea.


Você pode conhecer o livro clicando aqui.


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Sobre “Todo esse amor que inventamos para nós”…

Um livro de 150 páginas divididas em 31 contos. O suficiente para criar um catálogo de infernos possíveis à realidade do homem gay no Brasil contemporâneo. O suficiente para desvelar, dentro de cada um desses infernos, a possibilidade da felicidade pela fagulha do desejo que nasce e que parece durar alguns segundos – e toda uma eternidade. ⠀

Dolorosos, os contos narram o cotidiano cruel daqueles que antes de perceberem seus afetos e de entenderem seus corpos já são condenados pela sociedade. Com violências que ocorrem tanto dentro de casa como na rua, não há aqui espaço seguro nem garantia de que uma hora algo vai melhorar. O leitor vive aquele instante de descoberta que acarreta num interminável terror como se estivesse dentro do trauma que qualquer um faria questão de esquecer. ⠀

E o que há de mais especial no trabalho de Raimundo Neto é que suas narrativas, que poderiam tratar dum corriqueiro infernal, ganha lugar de reflexão por meio de uma linguagem trabalhada. E aqui há um elemento realmente interessante: não é a pessoa que se dissolve em questionamentos internos, como vemos em Caio Fernando Abreu, por exemplo, mas sim a própria palavra. ⠀

Assim, cria-se um véu em que somos obrigados a enxergar em frestas ou em meio a olhares sujos e opacos o que está acontecendo. Isso faz com que nós, leitores, tenhamos que completar a cena, interpretar a situação e, junto a isso, levantar nossos preconceitos. É uma experiência bastante sensorial, digna da boa produção literária brasileira.

por Paulo Lannes

Conheça Todo esse amor que inventamos para nós clicando aqui

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Gabriel Fragoso, sua baleia morta e uma colcha de retalhos

por Aline Teixeira

Autor estreia com livro de contos que revelam sentimentos tão inerentes quanto conflitantes.

Um livro carrega consigo um leque de possibilidades, as quais só são descobertas no decorrer da leitura. Alguns, em poucas páginas, já relevam mundos fantásticos; outros quase agem como teste vocacional ao provar os dotes policiais, científicos ou acadêmicos do leitor. Tem livros que prometem e cumprem a missão de fazer chorar, aquecer o coração ou render bons sustos. E há aqueles que enganam.

Ler relatos do dia a dia de alguém, ainda que na ficção, pode parecer uma zona de conforto. Todos acordamos, tomamos café, lavamos a louça, vez ou outra apreciamos uma obra de arte, não é mesmo? O que torna as coisas um pouco mais complexas é quando se é pego de surpresa pelo que há nas entrelinhas, coisas que às vezes são reveladas somente no último parágrafo, na última palavra, na última página. É aí que vem a comoção, a indignação, o encanto, a raiva, até a vergonha pelo sentimento compartilhado.

Em sua estreia na literatura, o escritor gaúcho Gabriel Fragoso apresenta 12 contos em uma obra delicada, intensa e sensorial, que pode se encaixar na categoria dos livros que enganam, mas que não subestimam.

Sensibilidade artística traduzida em palavras

Encontrar potência e delicadeza na mesma medida em uma obra literária é um presente. Saber que a obra é um livro de estreia torna a surpresa ainda mais grata. No caso de Gabriel Fragoso, prévias desse talento – que podemos chamar de dom – vêm sendo mostradas em outras artes antes da escrita.

O escritor de 27 anos de idade nasceu em Torres, litoral gaúcho, e mostra suas veias artísticas desde muito novo como bailarino, transmitindo através da expressão corporal a intensidade e a leveza requeridas pela dança. Como artista visual, expressa em seus projetos fotográficos, de ilustrações e de colagens, a mesma força capaz de causar impacto a quem aprecia.

Tamanha sensibilidade não poderia deixar a escrita de fora e, de fato, a escrita faz parte da vida de Gabriel. Publicitário de formação, usou a comunicação para publicar seus textos em revistas, coletâneas, trabalhar com literatura e partir para os estudos na área, graduando-se em Escrita Criativa pela PUCRS e já se preparando para um mestrado.

Alguns de seus textos receberam prêmios e agora Gabriel mostra o talento com a publicação de seu primeiro livro, angariando mais um novo feito em seu ciclo artístico, evidenciando (novamente) sua capacidade de atingir em cheio quem aprecia sua arte e o tornando uma grande promessa para o meio literário.

Tão intenso quanto a fome

Há títulos que dizem muito sobre o livro, mesmo quando parecem não ter sentido. Da mesma forma, há livros que fazem todo o sentido, ainda que pareçam absurdos ou tão corriqueiros que não reservam nada além do habitual. É justamente com um título aparentemente absurdo e escrita simples que Gabriel Fragoso faz incisões precisas no que cada um dos 12 contos propõe, como bisturis que cortam a carne e chegam naquele lugar profundo, tão profundo que não é palpável, mas intensamente sentido.

Baleia morta e outras fomes é um compilado de breves relatos que, de algum modo, conectam entre si e se conectam com quem os lê. O formato dessa colcha de retalhos é percebido aos poucos, às vezes quando menos se espera ou quando tanto se deseja, para que o sentimento provocado tenha uma justificativa.

Entre o solidarizar com o sofrimento, o extasiar com um momento de prazer e o repugnar com uma cena de tortura, com palavras que parecem um tomar pela mão, o autor encaminha o leitor por um banquete de sensações extremas e o deixa com fome, com aquela vontade que vem do âmago por saber mais, por experimentar mais. E Gabriel, como um habilidoso chef, põe à mesa uma variedade de sentimentos que todos têm, mas nem todos – nem sempre – gostam de sentir, embora queiram, até precisem e sequer se dão conta.

Gabriel imprime sua marca que mescla intensidade com sensibilidade e complementa ao trazer as artes ao livro, especificamente uma obra de arte, o quadro Vista das areias de Scheveningen de Hendrik Van Anthonissen, cujo a impressão literal da imagem empresta o nome à obra e o sentindo que se esconde nas pinceladas e nas entrelinham dá o tom de todo o trabalho, em especial do conto-título, um dos mais significativos da coletânea. É o óbvio que está escondido e que se torna estranho ao ser revelado, como uma frase que soa bizarra ao ser dita em voz alta. Com ilustrações de Gustavo Lindermann e posfácio de Altair Martins, Baleia morta e outras fomes faz parte do catálogo de lançamentos do primeiro semestre de 2021 da Editora Moinhos, colocando Gabriel Fragoso no hall de escritores brasileiros da casa, produtores de literatura nacional contemporânea de qualidade.

Conheça Baleia morta e outras fomes clicando aqui

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Cristina Bendek: Identidade, cultura e cenário sociopolítico em obra de estreia

Novela da escritora colombiana ganhou a primeira edição do Prêmio de Novela Elisa Mújica, em 2018.

O ato de deixar a terra natal pode representar tanto a busca por novas experiências em diferentes ares quanto a fuga de uma realidade nem sempre desejada. Mas o ditado “nós saímos da cidade onde nascemos, mas a cidade onde nascemos não sai de nós” por diversas vezes se faz verdadeiro e o retorno acaba sendo inevitável.

Embora as origens clamem pelo regresso, inevitável também é o choque de realidade ao constatar que aquele lugar-berço já não é mais o mesmo. Sentir-se pessoa estrangeira no próprio lar e perceber que, assim como mudamos com o tempo, a influência dos acontecimentos externos contribui para a formação de novas características acatadas como típicas de um povo, resultando em sua ascensão ou declínio.

Em uma mistura de ficção e crônica, a escritora colombiana Cristina Bendek retrata a realidade de sua ilha natal e a cultura local ao narrar as descobertas sobre as origens de uma filha desgarrada da terra.

os cristais do sal imagem capa

Ficção que evidencia a realidade

O indubitável tom de crítica social logo em um primeiro trabalho literário talvez se explique com a própria vivência da autora. Cristina Bendek nasceu em San Andrés (Colômbia), mas transitou entre Bogotá e Cidade do México durante treze anos. Graduou-se como profissional em Governo e Relações Internacionais e, em 2016, regressou à sua ilha natal para se dedicar à escrita, aliando o ofício aos trabalhos de empreendedorismo, jornalismo e crítica.

Pelo longo período de deslocamento, o choque em decorrência das perceptíveis mudanças no cenário tão conhecido da infância é uma consequência inevitável. A chegada da modernidade, a urbanização e a exploração do turismo ao vender uma imagem paradisíaca da ilha fazem um contraponto com a ruralidade, a cultura local e a identidade raizal da população de San Andrés.

A intensa percepção da realidade contraditória da ilha – o perfeito refúgio turístico caribenho que esconde a escravidão econômica e o descaso político perante o continente – é exposta na obra de Bendek, que relatou que sua novela de estreia tem muito de crônica, pois, apesar da ficção e da poesia contida em sua narrativa, retrata a realidade por ela percebida e, então, transformada em arte na forma literária.

Trabalho tão intimamente vivido e apresentado de modo a instigar reflexões acerca de questões políticas e sociais rendeu à jovem escritora, nascida em 1987, o Prêmio Nacional de Narrativas Elisa Mújica, promovido por Idartes e Laguna Libros (voltado exclusivamente a escritoras para promover a literatura feminina na Colômbia), em sua primeira edição no ano de 2018.

A busca pelas origens, o encontro com a nova realidade

Cristina Bendek presenteou a literatura do Caribe (e também a latino-americana) com a novela Os cristais do sal, obra que representa a realidade dos habitantes da ilha de San Andrés, tanto no quesito cultural quanto no âmbito social, econômico e político.

Ao narrar os passos de Victoria Baruq, a autora põe em foco a vida dos islenhos conhecidos como raizais, povo oriundo de uma miscelânea de etnias, do arquipélago e do continente, que acabaram por criar uma identidade própria, ao mesmo tempo em que não se sentem pertencentes a lugar algum, não se consideram provenientes de uma origem única. É a busca por tal origem que move os caminhos trilhados pela protagonista que, com o sentimento de não-pertença, deixa sua terra-mãe em busca de novos rumos, mas não escapa do magnetismo do seu berço.

Em meio a encontros e desencontros, achados e perdidos, o holofote é direcionado a outro ponto importante para a ilha caribenha que, com o passar do tempo, vê a chegada dos avanços da modernidade e a oportunidade no ramo do turismo. O que muito tem de promissor, pouco tem de retorno ao se deparar com a negligência do Estado para com os habitantes da ilha, a falta de infraestrutura para os residentes contrasta com o que é oferecido aos turistas. O choque de realidade decorrente da globalização não foge aos olhos da personagem do livro, assim como escancara a ferida da exploração encoberta pelos folhetos e fotos de belas praias.

Apesar de carregar o peso de uma nação, Bendek alivia o fardo com sua escrita que traz os elementos críticos da crônica e a leveza da poesia. A busca pela identidade através do resgate genealógico é o retrato de muitos filhos de uma terra a qual se sentem tão íntimos e, ainda assim, tão distantes. Essa característica, além de laurear a autora sanandresana, coloca o arquipélago em destaque na literatura nacional colombiana.

Os cristais do sal chega ao Brasil pela Editora Moinhos, no catálogo de lançamentos do primeiro semestre de 2021. Com tradução de Silvia Massimini Felix, o livro carrega uma premissa realista um tanto densa, sem abrir mão da suavidade dos eventos corriqueiros, atraindo os olhares para uma autora que ainda pode contribuir muito para a literatura latino-americana.

Clique aqui para conhecer Os cristais do sal, de Cristina Bendek

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Entrevista com Michel de Oliveira

Michel de Oliveira Entrevista

Depois de duas coletâneas de contos, você agora apresenta ao público um livro de poesias. O que o fez se aventurar nesse estilo? Era algo que já estava em seus planos?

Sempre me considerei prosador, nem na adolescência escrevi versos. Foi uma surpresa para mim quando, nos últimos anos, brinquei de escrever poesias. Fazia isso nas notas do celular, às vezes enviava para algum amigo ou amiga dizendo com ironia: vou virar poeta agora. E ríamos. Daí veio a pandemia, um completo esgotamento mental, não queria ler, nem saber das notícias. De forma muito espontânea, ao tentar escrever um conto, saiu em verso, e eu respeitei. Então decidi reunir as poesias que estavam no celular e me surpreendi com a quantidade: mais de 50. Uma parte significativa delas sobre amor ou paixão. Descobri um embrião de livro não planejado e decidi levar a gestação criativa adiante. Brinquei de escrever mais uns poemas, arquitetei a estrutura interna da obra e aí está O amor são tontas coisas.

Para você, houve muita diferença no processo criativo entre as narrativas curtas dos contos e microcontos para os versos dos poemas?

No que diz respeito à motivação para a escrita, não. Sigo escrevendo de forma intuitiva e sem planejamento, quando algo me afeta, incomoda ou surpreende. Mas o desenrolar do processo foi bem diferente, porque as poesias nascem prontas. Se eu mexo demais, acabo estragando. Então não precisei fazer mil edições, com os contos o processo todo é mais lento. Acabei me divertindo escrevendo e organizando as poesias, porque na minha cabeça era uma grande brincadeira. Agora, que o livro está pronto e vai ganhar o mundo, me bate certo desespero, porque saí total da minha zona de conforto e não faço ideia de como leitores e leitoras receberão essa brincadeira poética. Espero não passar vergonha.

O trocadilho no título O amor são tontas coisas o torna um tanto emblemático e faz aguçar a curiosidade sobre o que encontrar nos poemas do livro. O que da relação entre o quantitativo e o qualitativo do sentimento o levou a essa escolha?

Nem sei direito de onde veio a ideia do título, mas anotei no celular: o amor são tantas coisas. Gostava dele, mas ainda não era o que eu queria dizer com o livro. Foi quando, por brincadeira, troquei o tantas por tontas e ficou. Enquanto respondo a esta entrevista, penso que a mudança foi influenciada pela motivação de divertimento que me levou a escrever os poemas. De alguma forma, eu estava buscado uma fuga para a severidade das coisas, do momento histórico, da vida e do próprio tema amor, que sempre é tratado como algo grande, colossal. O amor abordado pelo livro é pequeno, como os poemas; uma bobagem que alegra o dia, feito uma cereja; e meio sem sentido, uma tontice que nos tira do eixo. Ou coloca no eixo certo, não sei.  

Em seus trabalhos anteriores, por mais distintos que sejam entre si, nota-se uma perspicácia capaz de promover intensidade e até choque durante a leitura. Também se detecta esse traço nos poemas de O amor são tontas coisas. Há alguma expectativa quanto à experiência que os leitores terão com o seu estilo de escrita?

Meus primeiros escritos tinham a intenção explícita de incomodar. Era minha motivação jogar pedras em quem me lesse. Mas passei a me sentir um pinscher raivoso latindo no portão e fui ficando mais calmo. Achava eu que minha escrita tinha passado por uma grande mudança, mas quem me lê ainda fala de intensidade, choque, incômodo. Então havia algo para além da intenção de provocar incômodo. Pensando em voz alta, talvez isso venha da escrita direta, sem rodeios. Minha literatura é pouco literária, no sentido de não ter firulas, enfeites desnecessários para parecer poético, profundo e inteligente. Talvez seja a honestidade que choque, não sei.

Agora que você já publicou livros de contos e poesia, podemos esperar para breve um romance de sua autoria?

Meu segundo livro, em ordem de escrita, é um romance, porém outros projetos passaram na frente dele. O amor são tontas coisas, por exemplo, foi o último a ser escrito e furou a fila. A poesia parece mais ansiosa do que a prosa. Para mim, ao menos, está sendo. Se ficasse de molho, como os outros projetos, é bem possível que eu desistisse de publicar. A narrativa longa demanda um tempo grande de maturação, o que me irrita. Gosto de coisas rápidas, por isso meu apreço maior pelo conto. Se dependesse da minha vontade, já teria publicado. Mas os outros projetos pediram urgência, obedeci. Em breve, talvez, o romance seja publicado, quem sabe.

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Coração e vísceras entremeados em poemas de Michel de Oliveira

Autor de O sagrado coração do homem lança seu primeiro livro de poesia

Quando se fala em poesia, somos remetidos a textos escritos em versos que, com certa leveza, despertam em nós sentimentos variados. Embora não seja uma regra – e esteja bem longe disso –, quando o assunto é poesia o primeiro sentimento que vem à mente é o amor, o qual dizemos ser expresso com palavras quase sempre doces vindas do coração.

Porém, tanto a poesia não fala só de amor quanto o amor não é regido unicamente pelo coração. O sentimento é experimentado pelo corpo todo e, por vezes, são as entranhas que reivindicam a forma como o expressar e trazer à tona pensamentos e reações físicas que nem sempre gostamos de colocar para fora.

É nisso que aposta o escritor sergipano Michel de Oliveira ao se aventurar na poesia em seu novo livro, obra essa que fala de amor com intensidade que vai além de um único órgão do corpo.

Das narrativas curtas aos versos

Michel de Oliveira, jornalista, fotógrafo e escritor nascido em Tobias Barreto (Sergipe), mora em Aracaju. Além de participação em antologias e uma publicação sobre fotografias, é conhecido por seus livros de contos, que carregam um teor por vezes cáustico, por vezes satírico, mas que têm por objetivo atingir o âmago do leitor.

Em seu trabalho de estreia Cólicas, câimbras e outras dores (Oito e Meio, 2017), livro pré-selecionado no Prêmio Sesc de Literatura 2016 e finalista da 1ª Maratona Literária da Editora Oito e Meio/Carreira Literária, Michel narra sobre dores do cotidiano da forma que são sentidas, com desconforto angustiante que mesmo quem não as vivencia pode sentir. Já em O sagrado coração do homem, coletânea de contos finalista do Prêmio Açorianos, publicada pela Moinhos (2018), o autor dá um tom teológico repleto de sarcasmo e ironia ao falar sobre o que há por trás da masculinidade e sua ânsia por superioridade, o que, de certo modo, pode contestar a ideia de sexo frágil.

Graduado em Comunicação Social (Jornalismo) pela Universidade Federal de Sergipe, mestre em Comunicação pela Universidade Estadual de Londrina e doutor em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Michel agora ingressa no cenário da poesia nacional. Apesar da transição das narrativas curtas para os versos, o estilo provocativo e a crueza, constantes na essência de sua escrita, permanecem como marcas registradas que fazem de Michel de Oliveira um dos nomes proeminentes da literatura brasileira contemporânea.

Coisas de amor, que são tantas e tontas

Depois da prosa e da fotografia, Michel de Oliveira apresenta um novo trabalho em um novo estilo: o livro de poesias o amor são tontas coisas.

O amor como centro da obra oscila entre o clichê esperado e a surpresa do sentimento experimentado e nem sempre revelado, desperto em detalhes do cotidiano e vivenciado com intensidade por cada parte do corpo, inclusive aquelas em que menos se espera. Mistura que alterna da leveza ao peso, da melancolia ao êxtase, da delicadeza ao explícito que provoca.

A potência característica da escrita de Michel está impressa em cada verso, levando o sentimento aos sentidos e elevando as sensações a um nível quase visceral. Em sua escrita, o amor se torna palpável e é agarrado nos pequenos detalhes, por mais bobos que sejam, e são tantos.

Permitir-se enxergar o amor em coisas corriqueiras e o descrever no plano físico, associar e distribuir os impulsos aos respectivos órgãos do corpo para que estes manifestem a carga emocional contida, desfazer-se do pudor ao discorrer sobre a paixão com palavras simples que, de tão ordinárias, maximizam o efeito suave esperado dos poemas. São propostas contundentes dos escritos de Michel que tornam o mergulho, no livro e nas sensações, inevitável.

Dividido em duas partes, que podem ser descritas como estágios de reações emocionais e corporais ao sentimento tão almejado por boa parte da humanidade, o livro expõe o furor decorrente do se jogar de cabeça, despido e aberto, ao que o corpo manda depois de ouvir os sussurros do coração. E então resta apenas dar voz às demais partes da anatomia humana atingidas pelo ímpeto do sentir e arcar com as consequências.

Com orelha de Juliana Blasina, o amor são tontas coisas é um dos lançamentos do mês de fevereiro de 2021 da Editora Moinhos, mostrando a faceta poética de um escritor brasileiro que desnuda o profundo (e, muitas vezes, o indizível) do ser humano em palavras certeiras.

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María Zambrano e a Razão Poética

Primeira mulher vencedora do Prêmio Cervantes, pensadora uniu a filosofia e a poesia em um único conceito.

Ao denominar a filosofia como a busca concreta pelo saber, intrínseca ao ser humano, e a poesia como a manifestação transcendental e fluida, aberta à diversidade, utilizada para expressar a realidade, pode-se pensar que ambas as frentes seguem por caminhos opostos, correto? Não exatamente.

Uma pensadora expandiu os horizontes e construiu a ponte que interliga a razão e o mítico. Estamos falando de María Zambrano, escritora e filósofa espanhola que apresentou de forma peculiar um método diferente de pensar filosofia, com um estilo que caminha às margens, porém não foge nem renega as origens.

Mas quem foi María Zambrano?

Nascida em 1904 no município Vélez-Málaga, região da Andaluzia (Espanha), María Zambrano Alarcón foi a primeira mulher a ganhar o Prêmio Miguel de Cervantes em 1988, um dos mais importantes prêmios literários da língua espanhola.

Filha de professores, passou boa parte da infância em Segóvia, antes de partir à capital da Espanha e iniciar seus estudos em filosofia na Universidad Central de Madrid, onde conheceu os mestres José Ortega y Gasset, García Morente, Julián Besteiro e Xavier Zubiri, que se tornariam suas referências – principalmente Ortega y Gasset. Posteriormente, lecionou em algumas instituições, incluindo como substituta de Zubiri em Metafísica na Universidad Central, numa época em que poucas mulheres tinham sequer visibilidade.

Zambrano também contribuiu para alguns periódicos na década de 1930, como a Revista de Occidente, a Cruz y Raya e Hora de España, antes de se exilar por razões políticas durante a Guerra Civil Espanhola, período em que vivenciou os horrores da ditadura por estar do lado dos republicanos.

Durante o exílio, passou por diversos países, inclusive nas Américas, e teve contato com nomes ilustres como Octavio Paz e Albert Camus, retornando à Espanha somente em 1982, onde faleceu no ano de 1991. Esse período também rendeu grande parte da produção de sua obra, entre ensaios filosóficos e literatura, que deu a Zambrano o título de pensadora espanhola mais importante do século XX.

Um conceito onde filosofia e poesia coexistem

Embora seja uma personalidade renomada e digna de reconhecimento, María Zambrano ainda hoje é pouco conhecida fora do circuito acadêmico, quando não é desconhecida dentro no próprio meio. Parte se dá pelo estilo particular da pensadora espanhola ao criar sua linha filosófica que, apesar de beber na fonte clássica da filosofia, mostra divergências à racionalidade tradicional.

A filosofia existencial e, principalmente, o vitalismo são correntes filosóficas integrantes nas referências de Zambrano, mas são os ensinamentos do professor Ortega y Gasset que têm maior influência em seu trabalho, que defende o conceito de raciovitalismo ao dizer que é possível – se não inerente ao ser humano – investigar a vida e as suas circunstâncias estranhas a explicações lógicas utilizando a razão. Afinal, a realidade é um conjunto do saber com o sentir.

É daí que nasce a razão poética, inovadora linha de pensamento de María Zambrano, que difere da de seu mentor Ortega pela sensibilidade e pela possibilidade de reflexão sobre a multiplicidade da vida através do uso da metáfora, característica encontrada na poética e que traça o estilo próprio zambraniano, assim como a essência de suas obras acadêmicas e literárias.

O ser humano carece do saber racional tanto quanto de explicações sobre a história e crenças em manifestações tidas como sobrenaturais. Tal carência encontra na razão poética de Zambrano um meio de se conseguir respostas a questões essenciais, perguntas feitas no âmbito da realidade (filosófico) que encontram compreensão em meio ao caos no âmbito sensitivo e reflexivo (poético). O método reconhece a possibilidade de coexistência entre filosofia e poesia, distintas no conceito, unidas na essência humana.

Com estilo literário acessível aos diversos leitores e linha filosófica que demostra originalidade, María Zambrano reclama através de sua obra a imiscuidade da filosofia e da poesia, rompendo o discurso racional ao introduzir a metaforização em seu método para pensar sobre a vida e a ligação entre o humano e o mítico através da razão poética.

Um de seus principais trabalhos é Filosofia e poesia, livro que teve a primeira edição publicada em 1939. A obra propõe refletir sobre a conciliação entre as duas frentes – filosofia e poesia – através de sua narrativa racional poderosa unida à graciosidade de sua poesia. O livro Filosofia e poesia será um dos lançamentos de 2021 da Editora Moinhos, trazendo ao público brasileiro uma obra rica dessa premiada pensadora, relevante para a filosofia e para a literatura.

Você pode ler um trecho de Filosofia e poesia clicando aqui.