As ursas em seu profundo sono trazem ao mundo seus filhotes. Um urso nasce do que é sonho, calmaria, entrega. A dor parece ser sempre subvertida quando nos contam seus segredos esses belos animais. Nós, humanos, provocados a sermos sempre distantes e nunca nos enxergarmos como criatura que somos, perdemos a palavra que um urso traz na língua feroz: força. Nossa força diante do que não nos cabe mais parece se calar porque há medo, nascemos dele, diferente desses imponentes animais.
Marian Engel em Urso consegue fazer nossa pele sentir não só a temperatura de águas turvas, a textura de uma pelagem, mas nosso corpo como novamente parte da natureza em diálogo e não em celebração boba do que exotifica. A agressividade do que é humano jamais será a mesma linguagem do que nasce do urso. É preciso olhar o animal como quem quer experienciar vida e não como quem doma uma fera.
Lou, a personagem que cataloga livros e conversa com um urso, mesmo sendo a vida inteira uma pessoa que não gostava de animais, rasga em nosso coração o temor da mudança, essa que é gigante porque diz do que é dentro. Qual a diferença entre o corpo que hiberna e o que morre com as violências que não sabe nomear?
Urso nos faz ouvir uma nova linguagem sobre descobrimento de si e prazer profundo dos momentos que parecem bizarros, mas são genuinamente vida. Ler Marian é sentir nas mãos um coração que sangra enquanto brilha.
Monique Malcher
Adicionar ao carrinho